MOÇAMBIQUE 1991 (I)
1- Razão da viagem a Maputo, em 1991
Embora os principais objectivos da guerra
moçambicana tenham sido, não só acabar com a presença colonial e imperial
portuguesa no país conseguir, adquirir a independência de Moçambique e defender
as reivindicações dos cidadãos moçambicanos [1], mas também lutar
contra o colonialismo e o imperialismo cujos representantes eram os “capitais
norte-americanos, ingleses, franceses, alemães e japoneses"[2],
as pessoas e os bens do “cidadão branco e civil” eram considerados sagrados
conforme o declararam Samora Machel e Eduardo Mondlane, em 1964, no encontro
que tiveram com Alberto Joaquim Chipande e um grupo de jovens, em Dar-es-Salaam[3].
O certo é que, após o cessar-fogo a 08 de
Agosto de 1974 e a independência de Moçambique (25 Junho de 1975), os bens
pertencentes aos antigos colonos portugueses foram nacionalizados pelo Governo
Moçambicano ou colocados à sua disposição, sob condições propícias ao mesmo
Governo.
Mais tarde, criou-se uma Associação de Ex-Colonos
ou ex-residentes em Moçambique no intuito de solicitarem uma indemnização ao
Governo Português, colocando como intermediário o ICE - Instituto para a Cooperação Económica ), para o qual
se deveria encaminhar toda a documentação referente à posse dos respectivos
bens susceptíveis de reclamação.
Entusiasmada com estas perspectivas, a filha de
Da Maria Tabita Domingues Ferreira dos Santos, organizou a viagem, tendo-me solicitado
que a acompanhasse, livre de quaisquer encargos. Como ambos éramos professores,
aproveitámos o tempo da interrupção das aulas do período natalício, partindo de
Lisboa na última quinzena de Dezembro 1991, para regressar na primeira semana de Janeiro 1992.
2- Hospedagem no Hotel Polana
Nessa altura, as condições de alojamento, em Maputo, não eram as melhores. Os bons hoteis rareavam e as condições de segurança eram desconhecidas. O hotel que melhor condições oferecia, então, era o Polana que era bem conhecido pelas interessadas no processo. Foi, pois, neste hotel que permanecemos todo o tempo que necessitámos para levar a efeito os nossos propósitos.
Maria Tabita na rectaguarda dom hotel, junto ao que, agora, é a piscina
Mesmo, assim, o hotel estava em remodelações e reaproveitamento das suas instalações que tinha sofrido com as peripécias da guerra fratricida. Havia, no entanto, condições bastante boas, embora os custos fossem também bastante elevados e a piscina estivesse a ser reconstruída.
Parte junto ao mar
Relativamente às condições de hospedagem, tenhom a dizer que fomos muito bem tratados, tanto no que diz respeito à alimentação, como no que diz respeito às condições de alojamento e de serventia. O pessoal de mesa não tratou-nos como se fôssemos príncipes!
3-Visita à cidade de Maputo
Numa tardinha, já quase ao escorecer, fomos dar um passeio ao longo da rua que partia do hotel, virando à dirita. Mal tínhamos andado cerca de 200 metros, salta-nos à frente um miulitar de metralhadora em punho, dizendo:
- Alto aí! Quem são vocês? para onde vão?
- Somos portugueses e vamos dar um passeio.
- Não pode! Voltem para trás.
Mal nós sabiámos que estávamos perto de terreno militarizado ... talvez a zona governamental. Lá voltámos atrás, dirigindo-nos ao hotel, procurando saber onde poderíamos passear sem sermos impedidos.
O mesmo nos conteceu junto à Igreja de Nossa Senhora de Fátima. A dado momento sai de entre as bananeiras um outro soldado que nos alertou que, àquela hora, não eraa aconselhável passear sem sermos aompanhados de alguém da terra.Estes dois episódios convenceram-nos de que as condições de seguranção ainda não era as melhores! Daí em diante passámos a ter mais cuidado e só nos deslocávamos durante o dia e mesmo assim, usávamos frequentemente os táxis locais. Era mais seguro e os condutores davam-nos as indicações necessárias.
Os melhores locais para passear,
nesse tempo, eram a avenida marginal onde se podia passear, tomar e
frequentar um restaurante na Costa do Sol; a avenida principal onde havia
alguns cafés e restaurantes razoáveis e o Clube Naval. Também o Mercado da
baixa tinha algum interesse para fazermos compras e apreciarmos o movimento.
Era ali que tomávamos, normalmente, um táxi que nos levava de regresso ao hotel
Polana.
O autor na Marginal de Maputo
4- Dligências junto das autoridades competentes
No intuito de conseguirmos solicitar os
documentos comprovativos dos bens que pertenciam à Da. Maria Tabita Domingues
Ferreira dos Santos, dirigimo-nos à Repartição conveniente, tendo, então
encontrado dificuldades atrás de dificuldades! Parece que ninguém sabia como
proceder a tão melindroso pedido.
- Como? Não há nada que não seja do Governo
de Moçambique, diziam-nos imediatamente.
- Claro, respondíamos nós.
- Nós só queremos saber que bens se encontravam
em nome dessa senhor no tempo anterior à independência, explicávamos mais do
que uma vez.
- Isso tem que ir a outro lado.
E, de um lado para o outro, lá seguíamos nós na
expectativa de encontrar o que procurávamos.
A pé e de táxi lá percorríamos as ruas de Maputo
em busca do que desejávamos.
Os dias passavam rapidamente e nós não
conseguíamos o que pretendíamos. Aproximando-se o dia do regresso a Lisboa,
alguém nos aconselhou o velho estratagema da oferta de
"saguates".
- Ofereçam um bom "saguate" ...
- Rimo-nos, mas parece que as coisas andavam bem
dessa maneira.
O certo é que a documentação foi, finalmente
passada, faltando apenas a assinatura do Chefe que teve lugar no dia 04 de
Fevereiro de 1992. Ao deslocarmo-nos aos Registos Prediais entregaram-nos
os seguintes documentos:
1.
A descrição do Prédio número CINCO MIL
CENTO E VINTE E DOIS a folhas cento e noventa e oito do livro B barra é por extracto a seguinte: Terreno
com a área de novecentos e dezassete metros quadrados e cinquenta
decímetros, constitui a Parcela número cinco B do Talhão vinte e sete da
Cidade (...);
2.
A descrição do Prédio número OITO MIL TREZENTOS E NOVENTA E DOIS a
folhas quarenta e um verso do livro B barra cento e um do mesmo livro é por extracto a seguinte: Terreno
com a área de oitocentos e trinta e oito metros quadrados e setenta
decímetros e constitui o Talhão duzentos e quatro C, duzentos e seis C da Cidade
da Polana (…);
3.
A descrição do Prédio número VINTE E
SEIS MIL QUINHENTOS E QUINZE a folhas cento e setenta e quatro, verso do
livro B barra sessenta e nove é por extracto a seguinte:
Talhão trinta e seis H da Povoação da Catembe da
Circunscrição do Maputo, com a área de dois mil quatrocentos e quatro metros
quadrados e setecentos e noventa e três decímetros (…);
4.
A descrição do Prédio número TRINTA E
OITO MIL, SEISCENTOS E CINCO a folhas quarenta e uma do livro B barra cento
e um do mesmo livro é por extracto a seguinte: Talhão número trinta e nove H
da povoação da Catembe com a área de dois mil quinhentos e oito metros
quadrados e nove mil quinhentos e trinta e seis decímetros (...).
Cada um destes prédios, segundo o Ajudante
do Conservador, "encontra-se inscrito a favor da MARIA TABITA DOMINGUES
FERRERIA DOS SANTOS, divorciada, residente nesta cidade, mas abrangido pelo
artigo seis do Decreto-Lei número cinco barra setenta e seis, de cinco de Fevereiro".
5- Documentação enviada ao IPAD
No dia quatro de Março de mil novecentos e
noventa e dois a Dona Maria Tabita Domingues Ferreira dos Santos enviou uma
carta ao IPAD a possuía e pedir uma indemnização. Referia os bens que
deixara em Moçambique e avaliava-os – muito por baixo – em 36.162.00 (trinta e
seis milhões, cento e sessenta e dois mil escudos).
Como prova desses bens, fui eu (José Coelho
Matias) pessoalmente entregar a esse mesmo ICE - Instituto para a Cooperação Económica os Originais passados pela Conservatória de Moçambique,
documentos esses que esse Instituo nunca devolveu e aos quais nunca deu
alguma resposta, embora o pedido e os ditos originais tenham sido
recebidos.
Como prova, dessa recepção eu próprio pedi me fosse assinada uma cópia, que, efectivamente
foi assinadada pela recepcionista "Manuela" que escreveu:
- "Recebi
o original em 10/3/92"
Assinatura essa que foi acompanhada pelo carimbo circular que diz:
- "Instituto
para a Cooperação Económica".
Além destes prédios, soubemos através de
fontes seguras emanadas da Conservatória dos Registos Prediais que existia
ainda outra Propriedade – Plantação Saua-Saua – situada no concelho e distrito
do Mossuril, Província de NAMPULA cuja documentação só poderia ser solicitada
nos Registos dessa Província e onde não chegámos a ir por falta de tempo e de
meios disponíveis. Desta plantação e de sua posse falaremos em "Moçambique
2001 (II)", neste mesmo blog.
[2] Excerto do livro de Samora Machel A Luta continua Excerto do livro de Samora Machel A Luta continua.
(cf. http://www.macua.org/livros/lutacontinua.html)
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