Saturday, September 12, 2009

Uma visita de saudade à Rogenda

"Rogenda" é o nome dado, entre os habitantes da Freguesia de Lameiras a uma região que se situa entre as freguesias de Freixedas, Lameiras e Souropires todas pertencentes ao Concelho de Pinhel, Distrito da Guarda. E encontra-se a cerca de 3 km da Malta do lado esquerdo da Estrada Nacional, indo da Guarda para Pinhel. Saindo, para um caminho que dá para a Quinta da Rogenda e prédios circundantes, dá-se com uma entrada para uma propriedade que, nos anos 50, pertencia ao Sr. Horácio Beirão, sendo tratada durante alguns anos pelo Sr. António Matias, mais conhecido por António Germano.

Essa propriedade, nesses anos (e antes) podia dividir-se em quatro grandes parcelas: a primeira, a da entrada era constituída por um Pinhal e terreno lavradio; o segundo era constituído por uma grande extensão de enormes afloramentos graníticos; a terceira, depois de grande esforço tinha sido transformada em terreno apropriado para o cultivo de batata, hortaliça e legumes ou para trigo ou pomar, se o proprietário o desejasse; o quarto era constituído também por uma grande extensão de Rochas, igualmente graníticas e terreno baldio, onde cresciam apenas giestas, silvas e alguns pinheiros, aqui e ali.

O segundo quarto dessa extensa propriedade – parte granítica – começou a ser explorada por um grupo de pedreiros naturais de Alcains, com a finalidade de proporcionarem material de construção a belos edifícios da cidade da Guarda, entre os quais se contam a estátua de D. Sancho, a Casa de Santa Zita, o Tribunal e outros.
Para serem auxiliados nos seus trabalhos e para se sentirem integrados na sociedade oriunda do Concelho, o chefe desse grupo convidou alguns pedreiros de Lameiras, entre os quais esteve desde o início o Sr. António Matias, e o autor destas linhas, entre os 11/13 anos de idade, sendo-lhe consignado o ofício de cozinheiro (ou seja, o de recolher lenha, ir à fonte, deitar água nas panelas, deitar-lhe o fogo, olhar pela sua cozedura) e de distribuidor do material de pedreiro que consistia em reunir os picos, cinzéis, escopros; levá-los à forja para serem aguçados e temperados e redistribui-los pelos seus respectivos proprietários.

Sobre o muro da antiga forja

Foto de Setembro 2009


Nessa altura, essa parte da propriedade revestia-se de grandíssimos e multiformes penedos, entre os quais foi construída uma casa para habitação dos pedreiros de Alcains, e uma forja, onde, desventuradamente queimei uma das mãos por tê-la colocado sobre um pico que se encontrava sobre a safra e sobre a qual incidia o sol tornando-o invisível.

Lídia Matias em frente à casa dos pedreiros de Alcaíns

Foto de 3 de Setembro de 2009

Lembro-me, ainda que tais penedos – afloramentos de granito – classificado com granito cinza em Pinhel apresentavam várias formas às quais dava pouco ou nenhum sentido especial, assim como o restante pessoal que ali trabalhava. Mas sempre me causaram certa admiração algumas formas que me faziam lembrar figuras humanas ou de animais, algumas formas circulares e semicirculares que via sobre algumas rochas que percorria a saltitar, cheio ainda de juventude. Sempre encontrei estranha a existência de um engenho que me parecia um lagar de vinho com o seu pio adjacente.

Os anos rodaram, os pedreiros sucederam-se, e o negócio da pedra continuou com altos e baixos, exactamente como o que me aconteceu a mim, pois se foi em 1953 que deixei aquele emprego e com ele o meu País, só regressei a esse mesmo lugar, e como em visita de saudade, em 2002, 2004 e, por último em 2009, desta última vez, acompanhado pela minha irmã Lídia, para também ela matar saudades.

Quando ali regressei, a extracção da pedra tinha-se deslocado para a quarta e última parte da propriedade da Rogenda. Porque razão tal aconteceu, não sei, não investiguei, nem tenho a intenção de o fazer.

Na ânsia de reviver tempos passados e de rever imagens antigas, lanço-me à procura daquilo de que ainda me lembrava. Percorro todos os lugares que posso, salto de rocha em rocha, mas já com muita dificuldade devido ao peso dos anos que me envelhecem e consigo reencontrar, pelo menos parte dessas imagens anteriores. Estou falando da primeira e segunda visitas, as de 2002 e 2004. Pelo menos as rochas cujas imagens me ficaram melhor gravadas na memória ainda se encontravam no seu devido lugar e intactas. Delas, sem dúvida, fiz um registo fotográfico que ainda possuo e conservo com todo o zelo.

Mas na terceira visita, a de 4 de Setembro de 2009, a minha perplexidade foi ao auge! Após várias rondas pelo local apropriado, não consegui encontrar o monumento que era mais visível e que tocava mais a gente agrária e vinícola da região Pinhel. O antigo Lagar e Pio rupestres deixaram de se encontrar no sítio em que sempre os conheci. Terão sido destruídos, ou transladados para outro lugar? Eis a minha questão. Por tudo o que pude constatar, desapareceram, não resistindo à extracção indiscriminada do granito.

Ficaram, no entanto, um número reduzido de rochedos que possuem covinhas gravadas e outros cujas características morfológicas insólitas e enigmáticas me fazem mergulhar num mundo de sonho e de mistério. É certo que as covinhas gravadas nas rochas (algumas das quais podem ser naturais) constituem, ainda hoje, um mistério. Pouco se sabe acerca da sua origem e da sua finalidade. Assim, relativamente às que encontrei na Rogenda, não poderei dar senão um palpite e, mais tarde evidentemente.

Este vasto território encontra-se insuficientemente prospectado. Até ao momento, identificámos algumas rochas de carácter dolménico (rocha antropomórfica, Rocha ofídica (em forma de cabeça de serpente), Rocha em forma de cabeça de orca e rochas com covinhas) . Estes monumentos encontram-se ainda em bom estado e todos na região que circunda a casa dos pedreiros de Alcains, construída nos anos 1950-1951.

Nessa altura, uma extensão de cerca de 1000 metros quadrados, estava coberta por enormes afloramentos graníticos que, pouco a pouco, foram rebentados. Entre esta parcela e outra mais a poente encontra-se um terreno de cultivo (hoje abandonado). Logo a seguir a este terrenos existia outra extensão de rochedos, menos agigantados os quais nunca foram explorados pelos Pedreiros de Alcains, pelo menos segundo me consta.

Nesta última área encontrei e pude fotografar um Lagar com o seu Pio respectivo, ambos escavados numa rocha rasa que se encontrava praticamente à flor do solo. Passados 5 anos, isto é a 4 de Setembro de 2009, ali me desloquei novamente, mas já não encontrei esses dois representantes do passado. Terá sido devido à minha imperícia e cansaço ou terá mesmo sido destruída pela pedreira que ali funcionou durante vários anos, mas inactiva no momento desta minha visita? Gostaria de ter uma confirmação.

Lagar e Pio num único monólito

Foto de 2002

No entanto e, felizmente, alguma coisa ainda ficou intacta. Nas proximidades desta casa, dos pedreiros de Alcains existem ainda:

- Um Monólito a Leste em forma ovular com duas covinhas (Logo à entrada da área, seguindo o trilho central da propriedade);

- Dois núcleos de rochas com covinhas, a Norte;

- Um dos núcleos, situado a cerca de 10 metros, a norte da casa, é constituído por um painel principal com 6 ou 7 covinhas;


- Um outro núcleo, a Sul, é constituído apenas por uma figura composta de duas pocinhas circulares ligadas entre si por um estreito canal, o que talvez possa entrar na categoria de “copos e anéis).



O segundo núcleo é também composto por afloramentos diversos e mais distantes entre si e em relação à casa, como, por exemplo:

- Vários monólitos gravados com covinhas de diferentes formas





- Um Monólito-móvel, ou talvez um menir fálico, em forma de Serpente:


- Um outro em forma de Orca ou de golfinho:


Dois monólito em forma de cabeça humana:


- uma, deitada de nuca para baixo, a Nascente da casa;



- e outra, a Poente da casa, com o lado esquerdo enconstado,



Em conclusão direi que todas as covinhas dos diversos rochedos possuem diâmetro e profundidade muito variadas, destacando-se, em alguns casos, uma ou várias covinhas de grandes dimensões, entre as quais algumas parecem ter sido ocasionadas pela erosão.

Por outro lado, todos esses painéis gravados com covinhas encontram-se ao ar livre tendo como suporte rochas graníticas. Todas, à excepção de uma, são gravadas em afloramentos ou monólitos-blocos móveis. É, pois de encarar a hipótese de se tratar de um recinto muito apropriado à “ litolatria”.

Oxalá que o pouco que ainda existe, seja preservado para recreação de quantos nos sucederem!

José dos Montes hermínios

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